Eu gosto da palavra bacanérrimo desde a primeira vez que ouvi. Desde então, uso mesmo. Sinceramente, este foi o único critério para escolher o nome do meu blog. Gosto de escrever mas tenho vergonha de mostrar o que escrevo. Então decidi ficar escondida atrás de uma URL simpática. E esperar que alguma coisa que eu escreva aqui vire spam e chegue um dia por e-mail, como se fosse um texto do Luiz Fernando Veríssimo. Ui, seria a glória.
13 de jul. de 2013
Para Cora, com todo o meu amor.
Desde que me conheço por gente uma escadaria pode virar palco, a lâmpada que ilumina o arbusto da praça vira holofote do meu show, caixa de papelão e lanterna se transformam em teatrinho de sombras. Tive amigos imaginários, cheguei a acreditar por um tempo que era a Emília do Sítio do Picapau Amarelo e esse negócio de faz de conta sempre funcionou muito para mim. Em parte porque criança é assim mesmo. Mas muito e definitivamente porque eu tenho a Cora.
Minha tia, fada madrinha, inspiradora, a melhor contadora de histórias do mundo que eu e meus irmãos tivemos a sorte de ter sempre por perto. Acho difícil lembrar de momentos da nossa infância em que ela não estava. Colada na gente.
Ela entendia a riqueza e a fertilidade da nossa imaginação. Mais do que isso: ela amava estar na nossa companhia e adorava a maneira como a gente acreditava na realidade revisitada por ela. Ela escolhia um tema, enfeitava, colocava purpurina, cobria com calda de chocolate e a conexão com a gente acontecia sem forçar barra nenhuma. Desenhava, pintava quadros, cantava, fazia comentários ácidos, cozinhava mal, escrevia. Afe, como ela escrevia.
As histórias dela eram mais interessantes do que a dos livros (que ela também nos ensinou a adorar) porque a gente ouvia enquanto ia bisbilhotar pessoalmente a casa da bruxa malvada. Ela nos colocava no fusquinha creme (que hoje eu tento imitar) sem cinto de segurança, pegava uma estrada de terra e parava perto de uma cerca de onde a gente podia observar uma casa de madeira cinza escuro. Lá vivia uma velhinha com uns 40 gatos. Brigilda era o nome da bruxa. E a gente ficava ali de tocaia até vê-la saindo pela porta. Nessa hora ela ligava o carro, acelerava e a gente fugia com o coração saindo pela boca.
Foram tantas e tantas histórias. E nunca houve sequer uma piscadela de olho ou qualquer sugestão de que aquelas coisas não eram a mais pura verdade.
Só no ano passado ela mesma me revelou que a bruxa era uma senhora que fabricava flores artificiais. Que as flores de pessegueiro eram lindas e ela mesmo encomendava de vez em quando. Acho que isso foi a única coisa que eu jamais poderia imaginar sobre a Brigilda.
Todo o resto eu imaginei. E se hoje eu desconfio que sei escrever e que consigo olhar para a realidade de uma maneira mais colorida ou, às vezes, muito mais escura, tenho certeza de que é pura influência dela.
Ontem uma grande parte da minha alegria e de tudo o que eu sou desapareceu. Vai dar um trabalhão começar a imaginar e inventar um jeito de viver sabendo que a Cora não está mais aqui.
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8 comentários:
FLAVINHA, SEI MUITO BEM O QUANTO A CORA GOSTAVA, DE FORMA MUITO ESPECIAL, DE VOCÊS. CADA UM ERA CHAMADO DE UMA FORMA CARINHOSA. TU ERAS A "BELA". EM ALGUM LUGAR ELA ESTARÁ VIGIANDO A VIDA DAQUELES QUE ELA TANTO AMOU.
PARABÉNS PELO TEU TEXTO TÃO LINDO E REVELADOR.BJ
Você percebe que a sua tia conseguiu fazer você voltar a escrever aqui?
bjbj
Gi
Fla, sua tia Cora vive em você, hoje, e em tudo o que ela (inclusive por meio de você), está deixando para o mundo.
Parabéns pelo texto e pela tia.
Bjos!!
Ainda bem que você teve a Cora. E vai continuar a tê-la, ao usar a sua imaginação, então como ia dizendo, você sempre vai tê-la.
Se soubesse antes teria te abraçado mais.
beijo
Lili
Também tenho um tio assim. E ler isso me mostrou que tenho que visitá-lo mais.
Força para você. Mas não esqueça que você tem muito mais razões para se alegrar do que para sofrer pela sua tia.
abraço
Flá
Desculpe, como não haviam atualizações eu havia deixado de visitar o blog. Acabo de ver, pelo blog do Vitor, que havias escrito algo e, chegando aqui, li sobre tua tia. Ela fará falta, mas o importante é que tu a tiveste tanto tempo e aprendeste tanto com ela. Não a conhecia mas, sabendo que ela te influenciou, sei que deve ter sido uma pessoa fantástica, pois tu a refletes. Pode ser piegas, mas as pessoas não se vão. Nós as guardamos no coração e sempre podemos ir com elas à casa da bruxa, quando fechamos nossos olhos. Um beijo
F
Meus sentimentos. Mesmo. Bjos
q lindo isso
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